O GAROTO DA RUA 666
— Não quero ir para escola! Estou me sentindo mau.
— Tudo bem, meu filho. Estou indo trabalhar. Até mais tarde.
— Até.
Norberto estava mentindo para sua mãe. Ele tinha avaliação e não havia estudado. Ela quase não possuía tempo para acompanhar os estudos do único filho. Sua mãe era empregada doméstica e saía muito cedo de casa, sendo que, muitas das vezes, sem hora para voltar. Ele saiu do seu quarto e foi até a despensa para pegar algo para comer, enquanto assistia a uma série de TV.
— #$%$#! Não tem nada de bom!
Ele pegou um biscoito cream cracker e voltou para seu quarto desapontado.
— $%$#@! Não acredito! Volta, sinal! — disse Norberto, revoltado.
O sinal da TV a cabo havia caído. Ele ficou com mais raiva ainda, pois não poderia reclamar com a operadora, já que o sinal era pirata.
— %$#%@! O jeito é dar uma volta por aí. Vou ao shopping — disse Norberto, pensando nos pedaços de pizza que as pessoas deixavam sobrando nas bandejas quando iam embora e que ele poderia pegar.
Ele só trocou a camisa e saiu. Aproveitando a gratuidade do ônibus para estudante, seguiu para o shopping mais próximo. Norberto andou pelo shopping todo, olhando para as coisas, que ele estava longe de ter um dia. Chegando à praça de alimentação, ele fez exatamente o que havia imaginado. Pegou vários restos de pizza que as pessoas haviam deixado na bandeja. Até meia lata de refrigerante encontrou.
Quando pegou o último resto de pizza, percebeu que um dos seguranças do shopping estava se aproximando. Norberto imediatamente saiu do local, a passos largos. Mais dois seguranças se juntaram ao que estava se aproximando dele e foram em sua direção falando pelos rádios.
Ele correu para a saída e os seguranças correram atrás. Por pouco conseguiu sair. Olhou para trás e ninguém o perseguia mais. Norberto resolveu voltar para casa.
Depois de quase uma hora de espera o seu ônibus chegou. Ele embarcou e, em mais um momento de azar, seu cartão de gratuidade não passou. Norberto ainda tentou fazer cara de triste e desolado para o motorista, mas foi ignorado. O mesmo, que estava estressado, devido ao seu ônibus ter dado problema minutos atrás, não deu uma chance para Norberto. Ele mandou o garoto descer e ir resolver o problema do cartão.
A casa de dele não era muito longe, mas seria quase uma hora de caminhada. Como o dia não estava tão quente, ele resolveu ir andando mesmo.
Nessa caminhada, Norberto ficou refletindo na %$#@$ de vida que ele tinha e nas chances que poderia ter para mudar seu destino.
— Eu devia ter ido para escola. Acho que não tenho alternativa — pensou ele, cansado.
Já bem perto de casa, Norberto ouviu o barulho de algo que parecia ser…
— TIROS — disse ele, em voz alta.
Por um segundo, Norberto olhou para todos os lados para saber de onde vinham. Ele ouviu a sirene da policia e logo viu uma viatura que perseguia um carro prata. Bandidos trocavam tiros com os policiais e vários disparos passaram bem perto dele.
Norberto se jogou no chão e depois de uns minutos, quando o barulho dos tiros estava longe, ele levantou.
— Mas que $%#$*! Nunca vi algo assim aqui perto de casa. A violência está se espalhando mesmo — disse ele para si mesmo, olhando para a placa do nome da rua, 66(6).
Ele seguiu seu caminho quando de repente…
***
— Hã! O que houve? Que lugar é esse? Que gritos são esses? — disse Norberto, olhando para todos os lados.
Um ser estranho, bípede e sem olhos se aproximou.
— Bem-vindo! Entre naquela fila, para a triagem.
— AHHHH! SAI! SAI! — gritou Norberto, desesperado.
— Acalme-se. Não sou eu quem vai aplicar seu castigo. Entre na fila e aguarde — disse o ser estranho, se afastando e indo em direção à outra coisa que parecia ser uma…
— ALMA! — disse ele, assustado.
Norberto olhou para as mãos e depois para todos os lados. Aos poucos as coisas foram fazendo sentido e ele chegou à conclusão…
— Mas que %$#%¨! Como eu morri? Então o inferno existe? — ficou se questionando.
Ele seguiu para a fila enorme de almas que aguardavam pela triagem. Norberto imaginou que seria para saber que tipo de castigo que ele iria sofrer. Nesse momento ele pensou em todas as coisas ruins que já havia feito na vida. Um desespero tomou conta dele e o fez querer sair correndo.
— Ei! Você! Quer furar fila?
— Hã? Quem disse isso? — perguntou Norberto, olhando para trás.
Ele não viu ninguém e quando olhou para baixo…
— AAAAH! Cachorro demônio?
— Ei! Não grite! Se quer furar essa fila me acompanhe!
O demônio, que parecia um cachorro zumbi, seguiu para um caminho estreito que levava a uma cachoeira de larvas. Norberto hesitou por um momento, mas, por fim, resolveu seguir o pequeno demônio animal.
— Para onde está indo? — questionou ele.
— Apesar de ter tido uma vida de pecados, não era para você ter vindo para o inferno. Você parece ter um dom especial e precisamos que nos ajude a ir para outro inferno em busca de nosso mestre.
— Busca do seu mestre? Que mestre?
— Oras! O Senhor do inferno, Lúcifer!
— Como assim ajudar? Ajudar a encontrar Lúcifer? O que aconteceu com ele? Por que eu? Que dom que tenho? Como assim outro inferno?
— Calma, garoto! As explicações virão depois. Primeiro, vamos ver se você realmente pode atravessar o portal.
— Que portal? Explique-me! — tentou ordenar, nervoso.
— Aqui, atravesse! — ordenou o pequeno demônio lhe mostrando uma espécie de porta gelatinosa.
— Não vou encostar nisso!
— Você terá uma segunda chance, se fizer. Se não, aquela fila imensa lhe aguarda e, no final, irão decidir de qual pior maneira você passará a eternidade. Então…
— Ok! Ok! — disse Norberto, encostando na porta gelatinosa.
— Deu certo! — disse o pequeno demônio, se transformando em um homem de aparência elegante.
— Deu certo o quê? Afinal, o que é você? — questionou Norberto, olhando desconfiado para o elegante homem.
— Continue! Siga em frente! — disse o demônio elegante segurando a mão de Norberto.
Ele olhou para o demônio, estranhando sua atitude, mas ignorou o fato e seguiu em frente. Após atravessar a porta gelatinosa, eles saíram em um local rochoso e com chamas verdes para todos os lados.
— Que lugar é esse? — perguntou Norberto, confuso.
— Já começou, aqui!
— Começou o quê?
— O apocalipse!
— Como assim? Os demônios estão indo para o mundo dos mortais?
— Isso! — respondeu o demônio, deslumbrado.
— Vamos então! Tenho a chance de falar com minha mãe — disse Norberto, preocupado.
O demônio riu.
— Está rindo de quê? Não posso ir até o mundo dos vivos?
— Para lá você pode, sim! Uma vez aberta a passagem entre o inferno e o mundo dos vivos daqui, você pode ir à vontade, mas…
— Mas o quê? Diga-me!
— Eu ia dizer, mas você me interrompeu. Venha! Veja com seus próprios olhos.
Norberto seguiu o demônio até a enorme passagem que dava ao mundo dos vivos. Ele viu demônios atacando seres estranhos.
— Que lugar é esse? O que os demônios estão atacando. Onde estão os vivos?
— Aqueles são os vivos.
— Hã? Como assim?!
— São os vivos de outro planeta.
— O que? Então existe vida em outros planetas. Mas…
— Exatamente. Não só existe vida em outros planetas, como cada planeta com vida tem seu próprio céu e inferno. O portal que você atravessou comigo nos trouxe a esse inferno. Inferno de outro planeta, onde já começou o apocalipse — disse o demônio seriamente, interrompendo Norberto.
— Que loucura, mas ao mesmo tempo interessante — pensou Norberto. — Tudo bem! Até aqui entendi, mas o que viemos fazer nesse lugar? — perguntou ele, confuso.
— Como já havia dito, estou atrás de meu pai.
— Pai? Você disse que estava a procura do senhor das trevas, seu mestre. Lúcifer.
— Exatamente!
Norberto arregalou os olhos!
Quando ele ia dizer algo, uma luz vinda do céu o arrebatou. O demônio olhou para o alto e pensou:
— Como esses filhos da %$#@, descobriram? Sei que existem outros que funcionam como chave de portais entre os infernos… A questão é como encontrá-los!
O demônio ficou um tempo pensativo, olhando o fim do mundo ocorrendo no planeta Erthumwery. Ele arquitetou um excelente plano e quando se tocou que precisava voltar…
— $#%$#@! Estou preso aqui.
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